quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Gonçalo Anes Bandarra

Quase tudo o que se sabe com certeza da vida de Gonçalo
Anes Bandarra consta do seu processo inquisitorial, publicado
por Teófilo Braga na sua História de Camões (t. I, Porto 1873).
Ele deve ter nascido por volta de 1500 na vila de Trancoso (...)


Antes da publicação do seu processo, julgava-se que ele era
pobre e de origem muito modesta. Mas na sua declaração ao
Tribunal lemos que «fora rico e abastado, mas que queria mais
sua pobreza em dizer a verdade e o que cumpria à sua
consciência, que não dizer outra cousa». Também se julgava
que o sapateiro não sabia ler nem escrever, mas que ditava as
suas profecias ao Padre Gabriel João de Trancoso, o qual seria
o seu amanuense, tal como o fora Baruch do profeta Jeremias.
Era assim que se interpretava uma das suas trovas (aliás,
inautênticas) do seu chamado «Terceiro Corpo»:

Eu componho, mas não ponho
as letrinhas no papel,
que o devoto Gabriel
vai riscando quanto eu sonho.

Hoje se sabe que Bandarra não era nenhum analfabeto. Ele
mantinha correspondência com várias pessoas do Reino, entre
as quais se achavam figuras importantes, tal como o Dr. Francisco
Mendes, médico do Cardeal-Infante D. Afonso. Ele lia e
relia a «Brívia» (=Bíblia) em linguagem, sem dúvida, um texto
manuscrito, que tomara emprestado a um certo João Gomes de
Gião e tivera uns oito anos em casa. Dotado de uma memória
fidelíssima, sabia de cor longos trechos dos Livros Sagrados,
sobretudo dos profetas do Velho Testamento. Quando, depois
de restituído o livro ao seu dono, lhe acontecia que já não se
lembrava de um texto bíblico, consultava o Dr. Álvaro Cardoso
ou o clérigo Bartolomeu Rodrigues que tinham uma Bíblia latina
e lhe refrescavam a memória. Assim ele acabou passando por
oráculo em assuntos bíblicos, sobretudo entre os cristãos-novos,
que eram muito numerosos na Beira.

José van den Besselaar, As Trovas do Bandarra

ver Bandarra no Projecto Vercial

Trovas em versão integral

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